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19 de Abril de 2024

TJ-RS anula depoimento porque apenas juíza questionou testemunha

TJ-RS anula depoimento

Publicado por Diego Carvalho
há 6 anos

O artigo 212 do Código de Processo Penal diz que as perguntas feitas à testemunha devem ser formuladas pelas partes envolvidas no processo. E o juiz não pode admitir questionamentos que possam induzir a resposta, que não tenham relação com a causa ou que repitam o que já foi respondido. Em relação aos pontos não esclarecidos, o magistrado pode apenas complementar a inquirição.

Por violação desse dispositivo, a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decretou a nulidade do depoimento da mãe de uma menor que teria sido vítima de crime sexual. Com a decisão de acatar a preliminar de nulidade da oitiva, a sentença que condenou o acusado a 15 anos de prisão foi desconstituída. Os autos voltarão para o primeiro grau para marcação de nova audiência de instrução com a testemunha.

Segundo o relator da apelação, desembargador José Conrado Kurtz de Souza, a magistrada inquiriu com exclusividade a testemunha. Agindo assim, deixou de observar o previsto no artigo 212 do CPP, tomando para si a tarefa de ‘‘produção probatória’’. Em outras palavras, resumiu, a juíza produziu, sozinha, a prova. ‘‘Não fosse isso, igualmente está atestado nos autos que a Magistrada realizou perguntas fechadas e ratificativas de hipótese de viés acusatório.’’

Souza destacou trecho em que a juíza pergunta o seguinte à mãe da menor: ‘‘E a senhora não acha que essa rebeldia pode ter sido pelo abuso, pela falta de proteção em casa?’’. A seu ver, a juíza ‘‘trafegou na via acusatória’’, uma vez que os fatos a serem apurados no processo dizem respeito, exatamente, à possibilidade de ter havido abuso sexual. Afirmou que, ao questionar a rebeldia como decorrência do abuso sexual, a juíza adiantou o seu posicionamento de mérito. Afinal, deixou implícita a hipótese que, de fato, houve tal abuso, praticado pelo réu.

Vinculação psicológica

Conforme o relator, tal ilação poderia ser veiculada pelo representante do Ministério Público, que é o órgão acusador, mas jamais pelo julgador, que tem o dever legal de manter-se equidistante de formular esse tipo de hipótese — ainda mais se for de viés acusatório. E foi exatamente para evitar esta ‘‘contaminação da prova’’ pelo julgador que o legislador editou o artigo 212 do CPP, lembrou.

‘‘E não estou a dizer que a Magistrada tenha obrado conscientemente, muito menos de má-fé. (...) Dito em outras palavras, ainda que sem intenção, restou estampada a vinculação psicológica da Magistrada, no ato, à tese acusatória, o que fere o princípio da imparcialidade do Juiz, pressuposto processual de validade do ato’’, escreveu no acórdão.

O relator enfatizou ainda que o MP só pode se pronunciar depois de a juíza já ter inquirido longamente a testemunha. E o promotor de Justiça, diante desse quadro, limitou-se a dizer que não tinha perguntas a fazer. ‘‘Por fim, nem se diga que não houve prejuízo ao acusado. Com efeito, ficou evidenciado nos autos o desequilíbrio entre a acusação e a defesa, uma vez que o depoimento da mãe da vítima também foi utilizado como prova para a condenação do apelante’’, encerrou.


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